Região, tempo, cultivar e destino final compõem delicada equação que exige conhecimento, manejos diferenciados e adaptações constantes do agricultor
Produção de batata no Paraná - Crédito da imagem: Gilson Abreu/AEN
As alterações climáticas têm bagunçado a rotina dos produtores de batata no Brasil. Região, clima, cultivar e destino final da produção (mesa ou indústria) compõem uma delicada equação que exige conhecimento, manejos diferenciados e adaptações constantes do agricultor. O desafio é grande e tem aumentado conforme as temperaturas se tornam mais frequentemente inesperadas no calendário climático brasileiro. Quando a equação leva em conta que plantar um hectare de batata custa dez vezes mais que um hectare de cereal e que uma doença mal gerida chega a comprometer 100% da produção, o bataticultor pode ser encarado como um grande tomador de risco.
Ainda que o arroz e o feijão sejam um clássico nacional, a batata figura entre os protagonistas da alimentação no país. Com múltiplos preparos, natural ou industrializada, o tubérculo faz parte da rotina alimentar do brasileiro. No ano passado, foram produzidas 4,2 milhões de toneladas no Brasil, segundo o Instituto Brasilerio de Geografia e Estatística (IBGE), entre batatas de mesa, com venda direta ao consumidor, e para a indústria, transformada principalmente em batatas fritas.
Mesmo com a devida importância na dieta brasileira, a produção de batatas enfrenta grandes desafios no País. Segundo a bióloga Adriana Micheli, mestre em entomologia, doutora em fitopatologia e especialista em batatas, os riscos do cultivo são grandes e o produtor precisa errar o mínimo possível para garantir uma boa colheita. De acordo com ela, a batata é um cultivo dinâmico, o produtor não consegue seguir uma cartilha, depende de variações climáticas que interferem no surgimento de pragas e doenças.
A bióloga afirma que há uma grande demanda por informações sobre o cultivo de batatas no Brasil hoje e escassez de instituições e pesquisadores dedicados a esse produto no país. “Essas informações precisam ser mais acessíveis ao produtor”, afirma Adriana, que falou sobre o tema no Podcast Ascenza, que estará disponível este mês de novembro no site www.ascenza.com.br.
Segundo Adriana, a delicada equação transforma a batata em uma cultura muito desafiadora. Ela lembra que a época de plantio varia bastante conforme a região e que a batata gosta de noites frias. A bióloga cita como exemplo a região produtora de Guarapuava, no Paraná, onde a batata é plantada em agosto.
“Na safra passada o produtor da região sudeste de São Paulo enfrentou muito calor e falta de chuva, o que reduziu a produtividade em relação a anos anteriores, já na safra de setembro do ano passado na região de Guarapuava, tivemos excesso de chuva, o que também afetou a produtividade. Essas alterações climáticas estão cada vez mais frequentes”, afirma a especialista. O manejo adequado da planta é fundamental para o sucesso da produção. É preciso saber o momento certo de intervir na plantação para garantir maior produtividade.
Resiliência
Embora calendarizar o manejo do cultivo da batata seja uma tarefa difícil, Adriana comenta que quem consegue se antecipar às pragas e doenças obtém melhores resultados. “O bataticultor precisa ser muito atento e resiliente. Quando se fala em resiliência, se fala em batata”, diz. Ela aponta que o perfil dos produtores de batata está mudando no Brasil nos últimos anos.
Adriana lembra que, de modo geral, o produtor arrenda as terras para desenvolver o cultivo, com plantios em sequência. Ela comenta que nos últimos anos, porém, vem aumentando o número de produtores que cultivam a planta em terras próprias, com preparo antecipado e correção do solo para evitar riscos e garantir a produtividade. O manejo do cultivo dita o resultado da colheita. “A escolha do produtor no manejo da cultura de batata pode representar maior ou menor produtividade. Essa escolha faz toda a diferença no resultado final”, alega a especialista.
Desafios
A requeima é uma das principais doenças que afetam a batata, principalmente nos períodos mais frios. Também conhecida como mela, é causada pelo Phytophthora infestans, um organismo morfologicamente próximo aos fungos. Mais próximo do verão, os grandes desafios do cultivo são as pragas e a pinta-preta, causada por fungos do gênero Alternaria. Nos últimos anos, a doença tem se tornado mais agressiva e destrutiva em algumas regiões produtoras, o que tem dificultado o seu manejo.
Adriana comenta que o clima interfere no surgimento das pragas e doenças da batata. Na última safra em Guarapuava, a pinta-preta apareceu antes do previsto, assim como a mosca-minadora. José Rodolfo Forti, especialista em Desenvolvimento Técnico do Mercado da Ascenza, alerta que, conforme o clima, doenças secundárias podem passar a ser primárias.
“A larva-alfinete ocorre na maior parte das produções de batata, independentemente da região, mas a incidência de doenças e pragas varia muito. Requeima, pinta preta, mosca-minadora e mosca-branca afetam bastante a cultura de batatas. Ocorrências de murcha de verticílio, sarna e nematoides também preocupam os produtores do tubérculo”, aponta Adriana.
Prevenção, alerta e apaga-fogo
Segundo a bióloga, a cada 10% de severidade da praga ou doença, o produtor perde 190 quilos de batata por hectare. Mas ela lembra que há uma grande variedade de produtos para o manejo de pragas e doenças, inclusive biológicos e novas moléculas. Adriana divide o manejo em três fases principais.
“Há produtos específicos para uso preventivo com a finalidade de proteger o cultivo. Há os de alerta, que têm a função de evitar que a doença entre na plantação, e há os chamados apaga-fogo ou curativo, que são usados quando as pragas e doenças já afetaram a produção”, explica a bióloga
De acordo com a especialista, o ideal é não esperar a doença entrar na plantação. “O produtor deve usar o que tem no estoque, conforme o clima, monitorando sempre o cultivo, para evitar que a doença entre. Em um momento de grande severidade da doença, o melhor produto do mercado terá eficácia reduzida”, aponta.
A gerente de Marketing e Desenvolvimento de Mercado da Ascenza, Patrícia Cesarino, explica que o melhor manejo para prevenir doenças é unir e rotacionar de forma preventiva ativos diferentes, unindo ativos multissítio e sítio específicos e garantindo a cobertura por contato e ação sistêmica.
“No caso da requeima, tão perigosa na cultura da batata pela sua velocidade e agressividade, começar o manejo de forma preventiva com Torero® e, em situação de alerta, utilizar o lançamento Asbelto® Pro é a melhor maneira de evitar que essa doença se desenvolva na lavoura”, comenta Patrícia.
Perda total
Um ataque severo de pinta preta pode comprometer até 70% da produção de batata e a requeima pode consumir toda a plantação. “O manejo é fundamental para evitar perdas e reduzir custos com os agroquímicos”, diz Adriana. O técnico da Ascenza José Rodolfo Forti acrescenta que o produtor precisa entender o manejo com base em conhecimento para controlar os gastos e os prejuízos.
O ciclo do cultivo da batata de mesa demora 90 dias, enquanto o ciclo de cultivo da batata para a indústria, para a produção de batatas fritas ensacadas, demora 120 dias. Como o período de colheita da batata para indústria é maior, os riscos de o plantio ser afetado por pragas e doenças também é maior, por isso a importância do manejo desde o início do plantio.
Existem modelos de previsão de ocorrências de pragas e doenças, mas eles foram desenvolvidos por pesquisadores europeus, onde a batata conta com mais noites frias e maior disponibilidade de luz, portanto, não são adequados aos produtores nacionais. Os modelos no Brasil precisam ser regionais. De qualquer forma, as previsões do tempo, com alcance de até 15 dias, mesmo que não sejam precisas, ajudam bastante o produtor a definir a melhor estratégia de manejo.
Oferta e preço
Em Guarapuava, com o plantio em agosto e noites mais frias, os produtores colhem em média 50 toneladas de batatas por hectare, que chegam a 70 toneladas em algumas propriedades. Com a chegada do verão, a produtividade cai. Mesmo com a vantagem da maior produção, quando os produtores de Guarapuava entregam suas batatas para lavagem em dezembro, a oferta é maior e o preço é menor.
Por isso, alguns produtores adotam a estratégia de atrasar a colheita para colocá-la no mercado quando os preços estiverem melhores. Segundo Adriana, em dezembro do ano passado, o saco de 25 quilos de batata estava cotado a R$ 70,00, preço que subiu para R$ 140 no mês seguinte.
O plantio escalonado é outra alternativa para garantir melhores preços no mercado, lembrando que, nesses casos, o manejo do cultivo varia conforme a época em que cada plantio é feito, o que pode representar diferentes manejos em uma mesma propriedade.
“O plantio escalonado pode garantir melhores preços ao produtor, mas o manejo é muito diferente e os riscos são maiores. A batata leva entre 17 e 25 dias para emergir do solo, o que exige atenção contínua do produtor. Para produzir batata é preciso ter o coração forte. É um cultivo quebra-cabeças”, comenta a bióloga.
Apesar de todos os desafios, ainda há um grande espaço para ampliar a cultura da batata no Brasil em comparação aos cereais. “Há muita coisa para fazer, muito trabalho a ser desenvolvido. Existem muitos caminhos para ampliar a produção e há mercado para absorver essa expansão. Um dos caminhos é justamente aumentar a produtividade com o manejo adequado”, diz Adriana.
Números da batata no Brasil
Valor da produção - R$ 8,170 bilhões (2023)Quantidade produzida - 4,2 milhões de toneladas (2023)Área colhida - 123,4 mil hectares (2023)
Estabelecimentos 35.172 unidades (2017)Rendimento médio - 34 toneladas por hectare (2023)Maiores produtores - Minas Gerais, Paraná, São Paulo, Rio Grande do Sul, santa Catarina, Goiás e Bahia (2023)
Fonte - IBGE